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Papers Please e Republia Times: O cotidiano no autoritarismo

 Um governo autoritário e uma revolução sendo tramada, vários jogos trazem uma história mais ou menos como essa, mas a grande diferença desses dois que eu vou falar é o papel que o jogador desempenha nestes jogos. Nestes jogos você não assume o papel de um revolucionário querendo derrubar o governo, e também não é um governista tentando acabar com os planos dos rebeldes. Você é uma pessoa normal, que pode no máximo fazer sua parte para ajudar um dos interessados.

Ambos os jogos foram lançados por Lucas Pope, que atualmente é o único cara da indústria de games que eu sou realmente fã, Republia Times é um jogo criado originalmente em Flash, mas que continua disponível online e gratuitamente neste link. O jogo todo foi feito como um aquecimento para o Ludum Dare, uma competição de jogos feitos em apenas 48 horas. Já Papers Please é um jogo bem mais elaborado, embora claramente bebendo da mesma fonte, Papers Please está disponível para PC e Ipad.

A ideia de Republia Times é a seguinte: você é editor chefe de um jornal em Republia, sua função é escolher quais notícias vão para a capa do jornal e dependendo das noticias escolhidas a sua lealdade e a popularidade do seu jornal cresce e/ou diminui, com isso, você pode usar seu papel para fomentar revoltas ou aumentar a popularidade governamental, tudo isso com consequências politicas das suas escolhas. Um fator primordial é que a família do jogador está sendo "mantida em segurança" pelo governo, com a saúde e a segurança dos familiares sendo influenciadas pela escolha das noticias pelo jogador.

A ideia de Papers Please é similar: você é contratado como um oficial de fronteira de Arstotzka, sua função é fiscalizar quem entra e sai do país e mais uma vez você pode usar seu poder para ajudar um grupo rebelde ou dificultar a ação dos revoltosos. Um fator importantíssimo em Papers Please é o fator financeiro. Você é pago pela quantidade de pessoas que você corretamente deixa entrar ou proíbe a entrada, muitos erros acarretam em punições no seu pagamento, e o pagamento é essencial para pagar as suas contas e de sua família. Um mal desempenho financeiro leva a um dos vários finais ruins (o jogo tem um total de 20 finais diferentes).

Além de terem ideias parecidas, os dois jogos compartilham o mesmo universo, você frequentemente avaliará se cidadãos vindos de Republia são aptos para entrar em Arstotzka em Papers Please, assim como de alguns outros países retratados nas notícias de Republia Times.

O cerne de ambos os jogos é o dilema moral, aquela escolha entre fazer o que se acha certo e ser punido por isso ou seguir as regras e legitimar atos terríveis de governos autoritários, mas os jogos não são feitos apenas de dilemas morais, trazendo também alivio cômico, como um certo personagem de Papers Please que de tanto ser recusado acaba ficando amigo do jogador.

Em um mundo que se repete cada  vez mais a mentira de que games e politica não se misturam, Lucas Pope faz dois jogos absurdamente políticos de excelente qualidade. Papers Please e Republia Times são dois jogos que eu considero obrigatórios para todos que se interessem por jogos desse tipo, e são uma amostra, obviamente bastante caricata, de um cotidiano de um lugar autoritário. 

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